Mesmo evitando, por vezes damos connosco a visitar e a pensar nos lugares que ocuparemos para a eternidade…
Estes lugares espelham, mais que qualquer outra coisa, a memória, as crenças, a saudade e, sobretudo, o gosto, a cultura, a filosofia de vida e o sentido estético dos povos. Por vezes dou comigo a observar, com alguma atenção, os cemitérios dos diferentes lugares por onde vou viajando…
Acho lindíssimos os cemitérios americanos onde simples lápides e cruzes brancas assentam sobre campos verdes a perder de vista; aqueles onde o espaço parece não faltar e onde largos caminhos ladeados por folhosas árvores dão acesso a campas simples e a grandes obras de arte tumulares que pretendem perpetuar a memória (curta) dos homens. Recentemente fascinou-me a visão dos cemitérios na Finlândia, no norte da Europa, onde lápides simples e todas iguais se espalhavam pela floresta densa cheia de caruma, numa harmonia tal com a natureza que me fez chorar….
Estas imagens contrastam com muitos dos cemitérios espalhados pelas nossas pequenas aldeias aqui do norte de Portugal. O cemitério da minha aldeia, Covelo do Gerês, por onde tenho passado (recentemente) muitas vezes, impressiona pela negativa, revelando falta de planeamento, de visão, de gosto e, sobretudo, a dificuldade que temos em pensar e planear a morte, única coisa certa na vida. As campas acotovelam-se e sobrepõem-se umas às outras sendo preciso saltar e pisar por cima quando é necessário limpar e cuidar. O desrespeito pela memória de alguns é tal que das suas campas (ou sítios) originais, só restam pequenos retângulos aos pés de novas pedras tumulares grandes e feias que certamente usurparam lugares (até na morte) que não lhe pertenciam. À exiguidade e desorganização do espaço junta-se o gosto pessoal e “kitsche” de cada um, cada qual o mais extravagante, “mais diferente” e “mais feio”, querendo, talvez, mostrar na morte o que não conseguimos com a vida (ser mais ricos e mais importantes que os outros que estão ao nosso lado), ou será isto apenas falta de gosto, de sentido estético, de harmonia e de simplicidade?
Conseguirão as pessoas, independentemente da sua idade, riqueza, ou instrução, perceber que a verdadeira beleza está na simplicidade, no singelo, único, na harmonia com a natureza?
Será que conseguimos mudar esta imagem tão deprimente de um lugar que gostaríamos bonito, tranquilo e harmonioso, que nos estimulasse à paz e meditação, por nele repousarem os que mais amamos e onde iremos passar a eternidade?
Precisamos de pensar e falar um pouco sobre esta questão, representantes da comunidade, pároco, autarquia (Junta e Câmara Municipal), e começar a fazer alguma coisa para inverter esta situação. Não é complicado nem caro. Basta vontade para agir. Começo por dar o meu contributo propondo três medidas essenciais:
- Aumentar a área do cemitério, (os óbitos vão aumentar muito, a população está muito envelhecida) alargar caminhos e criar espaços entre as campas (a aldeia não tem falta de espaço, nem de campos, agora quase deserta e com os campos ao abandono);
- Plantar árvores, dão sombra, protegendo os materiais existentes, são belas e ecológicas contribuindo para reduzir as temperaturas nos dias de calor e o efeito estufa e, talvez o mais importante, dão-nos a sensação de paz, tranquilidade e eternidade a que aspiramos num lugar daqueles;
- Formação, sim, palavra mágica, tão em moda no léxico quotidiano, dar às pessoas algumas noções de planeamento, de decoração, arte, de modo a compreendermos melhor o espaço, a tradição, a natureza, e aquilo que ela nos oferece. Se existirem árvores e plantas talvez possamos acabar com os feios e malfadados plásticos, praga moderna da Humanidade e do Planeta.
É tempo de pararmos um pouco para observar com atenção, refletir, e pôr mãos à obra para fazer um cemitério mais bonito onde o espaço, a decoração, a beleza e a harmonia, contribuam para a nossa paz e serenidade eternas!
Laura Gonçalves, Drª
Setembro, 2019