João Soares Tavares
Ainda se verifica alguma confusão sobre a área geográfica e administrativa que totalizava a antiga Terra de Barroso. É frequente ouvir: “A Terra de Barroso abrangia os actuais concelhos de Montalegre e de Boticas”. Será mesmo assim?
Para esclarecer imprecisões, até de Entidades com responsabilidades administrativas e culturais, e vulgarmente observáveis em órgãos de Comunicação Social, decidi seguindo documentação verídica, escrever um apontamento sobre a constituição da Terra de Barroso e a sua posterior fragmentação.
Sobre a origem da Terra de Barroso não se conhece um documento fidedigno. Teorias existem. É por certo uma região muito antiga. Dois documentos da terceira década do século XVI (Ver nota 1) confirmam a Terra de Barroso com diferenciadas unidades concelhias em dimensão e importância. A documentação referida certifica também a vila de Montalegre cabeça administrativa da Terra de Barroso.
Segundo os documentos citados esse vasto território incluía:
1 – O concelho de Montalegre.
2 – O concelho de Vilar de Vacas.
3 – O concelho do castelo de Piconha.
4 – O concelho do castelo de Portelo.
5 – O Couto de Dornelas.
O concelho de Montalegre possuía o maior número de freguesias. (2)
Constituíam o concelho de Vilar de Vacas duas freguesias apenas – Campos e Ruivães. (3)
O concelho do castelo de Piconha incluía a vila de Tourém e três aldeias: Rubiás, Santiago e Meaos. Estas aldeias formaram o Couto Misto e eram habitadas indistintamente por portugueses e galegos.
O concelho de Portelo reunia “oyto aldeas de termo as quaes se chamã omrras: Vilar de Perdizes, Santo André, Solveira (Sobreyra), Gralhas, Meixedo, Padornelos, Padroso e Sendim.” Assim assegura o “Numeramento de D. João III” do século XVI (nota 1).Facto a assinalar, com base no documento citado, estas oito honras eram pequenas unidades territoriais com governo próprio, mas estavam dependentes da autoridade do alcaide do castelo de Portelo.
O documento “Demarcaçam da Villa de Montalegre…” de 1538, atesta a existência dos “lugares de honras” que são os seguintes: “Aldea de Villar de Perdizes, Aldea de Gralhas, Aldea de Padronelos, Aldea de Padroso, (…) e que estas quatro Aldeas sam subditas ao Castello de Portelo”. (nota 1) Portanto confirma a dependência da autoridade do Alcaide do Castelo de Portelo. De salientar, neste documento do século XVI datado cerca de 10 anos após o referido atrás, as aldeias de Solveira, Santo André, Sendim e Meixedo não aparecem referenciadas.
Segundo o mesmo documento, todas as unidades concelhias citadas estavam integradas na Terra de Barroso, e também coloca a vila de Montalegre cabeça daquele território. De onde se conclui a importância que apresentava.
A Reforma Administrativa de Silva Passos decretada em 6 de Novembro de 1836 promoveu a extinção de uns concelhos e a criação de outros. Houve concelhos cujos territórios diminuíram, enquanto noutros aumentaram. Esta Reforma não foi definitiva sofrendo diferentes alterações até 1853 e, no que diz respeito à Terra de Barroso prolongaram-se até 1898.
Em 1836 iniciou-se a divisão do vasto território. Nesse ano as honras citadas – Vilar de Perdizes, Santo André, Solveira, Gralhas, Meixedo, Padornelos, Padroso e Sendim – foram extintas, sendo integradas no concelho de Montalegre. Algumas destas freguesias sofreram um desvio temporário para Ervededo que anteriormente fora um couto, conforme será analisado abaixo.
O concelho de Boticas criado em 1836 recebeu as suas freguesias do concelho de Montalegre. Apenas as freguesias Anelhe e Ardãos transitaram do concelho de Chaves. (Ambas pertenceram anteriormente ao Julgado de Barroso conforme se verifica nas Inquirições afonsinas de 1258 referentes àquele Julgado). Em 1855, Anelhe regressou ao concelho de Chaves.
O concelho de Boticas fundado em 1836 conforme se disse, foi extinto em 1895 para ser novamente restaurado em 1898.
Até à estabilização dos concelhos houve freguesias que saltitaram de um para outro. A freguesia de Cervos esteve apenas dois anos no concelho de Boticas. (1936-38) Em 1838 voltou ao concelho de Montalegre. Fiães do Tâmega aldeia da freguesia de Curros do concelho de Montalegre, em 1834 foi elevada a paróquia. Esteve no concelho de Ribeira de Pena entre 1895 e 1898, ano em que passou definitivamente para o concelho de Boticas. É freguesia deste concelho tendo anexado a aldeia de Veral.
Do concelho de Montalegre transitou em 1839 para o concelho de Boticas a freguesia S. Salvador de Canedo. Permaneceu em Boticas até 1895, para nesse ano incorporar o concelho de Ribeira de Pena que fora criado em 1853. Parte das aldeias dessa freguesia: Canedo, Pena Longa, Seirós e Alijó formaram uma nova freguesia com o topónimo Canedo, enquanto as aldeias Viela e Melhe integraram a freguesia de Santa Marinha do referido concelho.
O pequeno concelho de Vilar de Vacas constituído pelas freguesias Campos e Ruivães, em 1706 incluía mais as “aldeias Fafião e Pincães da paróquia de S. Lourenço de Cabril, termo de Montalegre” e as aldeias “Linharelhos e Caniçó paróquia de Santa Maria de Salto, termo da vila de Montalegre”. (4) Pelo citado Decreto foi aumentado em 1836, recebendo as seguintes freguesias do concelho de Montalegre: Ferral, Cabril, Covelo do Gerês, Reigoso, Pondras, Salto, Venda Nova e Vila da Ponte. Um aumento com pouca durabilidade. Extinguiram o concelho em 1853 passando as freguesias Campos e Ruivães para o concelho de Vieira do Minho regressando as restantes freguesias referidas ao concelho de Montalegre.
O couto de Dornelas que inicialmente pertenceu ao arcebispado de Braga, em 1836 foi integrado como freguesia no concelho de Boticas. Aquele território é constituído por sete povoações.
Tourém, sede do concelho do castelo da Piconha extinto em 1836, passou a freguesia do concelho de Montalegre.
Em 1864 com a assinatura do Tratado dos Limites entre Portugal e Espanha, os três lugares Rubiás, Santiago, e Meaos, que formavam o Couto Misto, passaram a constituir território espanhol.
Algumas povoações da Terra de Barroso extinguiram-se, nomeadamente: S. Vicente do Gerês, Soutelo, Madalenas, S. Frutuoso de Barrosinho, Carrili, Padroselos. Esta aldeia que outrora pertenceu ao Julgado de Barroso é hoje uma imagem nostálgica do concelho de Ribeira de Pena.
Até se verificar a estabilização dos concelhos houve um saltitar de freguesias. Para finalizar apresento mais o seguinte exemplo: O couto de Ervededo que estava fora da Terra de Barroso, em 1836 foi também sujeito à Reforma Administrativa de Silva Passos. Nesse ano aumentou o pequeno território. Do concelho de Montalegre transitaram: Meixedo, Vilar de Perdizes (Santo André), Vilar de Perdizes (S. Miguel) e Solveira, portanto pertencentes outrora à Terra de Barroso. Com a nova constituição teve vida efémera. Foi extinto em 1853. As aldeias referidas regressaram ao concelho de Montalegre. As restantes ao concelho de Chaves.
A Lei nº 22/2012 de 30 de Maio que aprovou o regime jurídico da Reorganização Administrativa Territorial, e me abstenho de comentar, mais não pretendeu do que a redução do número de freguesias, aglutinando duas ou mais. Na primeira década deste século o concelho de Montalegre incluía 35 freguesias. Pela citada Lei nº 22/2012 esse número diminuiu para 25. Quanto ao concelho de Boticas que anteriormente incluía 16 freguesias, pelo mesmo motivo ficou reduzido a 10.
Resumindo: Conforme se constata, a antiga Terra de Barroso incluía diferentes unidades concelhias atrás referenciadas. A Reforma Administrativa de Silva Passos de 1836 provocou transformações significativas. Actualmente, o seu território encontra-se repartido por quatro concelhos localizados em dois distritos (Vila Real e Braga) (Ver figuras) e, uma pequena parcela foi deslocada para a Galiza. Do seguinte modo: em todo o concelho de Montalegre, na quase totalidade do concelho de Boticas, (excepto a freguesia de Ardãos, que pertencia ao concelho de Chaves), no concelho de Vieira do Minho, (freguesias de Ruivães e Campos), no concelho de Ribeira de Pena (toda a freguesia de Canedo e as aldeias Viela e Melhe da freguesia de Santa Marinha). Na Galiza permanecem as aldeias Rubiás, Santiago e Meaos localizadas a norte do concelho de Montalegre.
NOTAS:
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- “Numeramento mandado fazer por D. João III (1527-1530) “, in Archivo Histórico Português, vol. VII, publicado em Lisboa, 1909; “Demarcaçam da Villa de Montalegre Concelho de Barroso Diocisis de Braga e asy dos Castellos de Portelo e Castello de Piconha e daldeas das honras anexas a elles por ser tudo termo de Barroso e Tourem”, 1538, Arquivo da Casa de Bragança, Vila Viçosa.
- Foi fundado em 9 de Junho de 1273 pelo foral outorgado por D. Afonso III, Chancelaria de D. Afonso III, Livro I, f.110, I.A.N./T.T.
- Vilar de Vacas teve carta de foro outorgada por D. Pedro l em 27 de Junho de 1363. (Chancelaria de D. Pedro I, livro de Doações, fls.85vº e 86, I.A.N./T.
- Costa, P. António Carvalho da Costa – “Corografia Portugueza e descripçam Topográfica do famoso reino de Portuga”, Lisboa, 1706
(João Soares Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia)
Maravilhosa descrição do aparecimento e formação das Terras de Barroso.Grato por toda a informação.