NOTA INTRODUTÓRIA:
“ECOS DE BARROSO” resultou de uma ideia que foi amadurecendo associada à determinação do Doutor Manuel Afonso Machado.
Conhecedor do meu interesse pelos valores culturais da Terra de Barroso, assunto que estudo desde há perto de meio século, desafiou-me para o acompanhar nesta empreitada – um espaço cultural sem cor partidária.
Mais uma preocupação. Porém, será uma forma de preservar e divulgar a História de um Povo e, não podia responder negativamente a quem sempre me demonstrou honestidade intelectual e cortesia.
Para assinalar a inauguração de “Ecos de Barroso”, escolhi um assunto que já expus nos meus trabalhos editoriais sobre João Rodrigues Cabrilho, mas, ainda não lhe dedicara uma crónica pormenorizada.
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Quando nos anos setenta do século passado iniciei a investigação sobre o notável barrosão e distinto navegador, havia pouca informação em Portugal. Apenas algumas linhas em enciclopédias e um ou outro trabalho disperso referiam o feito maior de Cabrilho: descobrimento da Costa da Califórnia no século XVI. A tradição oral indiciava-o natural de Lapela, localidade do concelho de Montalegre. Todavia, outra aldeia – Tulha Nova – do concelho de Castro Daire também o queria filho da terra. A tradição tem interesse, mas insuficiente para o declarar natural da terra A ou da terra B. Era fundamental descobrir um documento histórico comprovativo. Os livros paroquiais dos séculos XV e XVI, referentes às freguesias das aldeias em questão que poderiam fornecer alguns dados não são conhecidos. Os documentos históricos do século XVI preservados nos principais arquivos nacionais “esqueceram” Cabrilho. Tive necessidade de pesquisar em arquivos mormente de Espanha e de Guatemala, territórios onde o navegador viveu, a fim de encontrar os elementos possíveis que me permitissem tirar conclusões acerca da sua nacionalidade, naturalidade e percurso. Somente depois assegurei sem receio a naturalidade de Cabrilho em Lapela, aldeia da freguesia de Cabril do concelho de Montalegre, e pude visualizar uma panorâmica da sua vida, trabalho investigativo já conhecido que divulguei em jornais e nos meus livros editados, que não irei aqui desenvolver para não me desviar do assunto desta crónica: a verdadeira fisionomia de João Rodrigues Cabrilho. (1)
Actualmente já se encontra alguma informação sobre Cabrilho na Internet, embora com algumas tolices à mistura. Haverá que ter cuidado com o “site” escolhido. Hoje, vou realçar um desses disparates, com a preocupação de informar o leitor interessado em História e em particular na vida de João Rodrigues Cabrilho.
Quem procurar pesquisar no “Google” o retrato de Cabrilho encontra reproduzida uma gravura a preto e branco legendada: “pintura de João Rodrigues Cabrilho”. (Fig. 1). Tem sido repetida até à exaustão em diferentes “sites”, em órgãos de comunicação social, e até a vi estampada num livro de um autor barrosão. Crédulo, convencido que era o retrato de Cabrilho, reproduziu-o no seu livro sobre temas de Barroso.
Essa gravura, que pretende identificar o navegador não é única. A mais antiga conhecida, diferente da gravura anterior, foi publicada em Outubro de 1892 no jornal “União Portuguesa” editado em Oakland cidade do estado norte-americano da Califórnia, referenciando ser “uma antiga gravura impressa no San Francisco Examiner”.
(Fig. 2) Encontrava-se legendada com o nome do navegador. Desconhecida em Portugal, revelei-a por curiosidade na página 35 do meu livro publicado em 1998: “João Rodrigues Cabrilho, Um Homem do Barroso?”. Simples observação permite constatar que pela técnica utilizada na composição não poderá ser uma gravura do século XVI.
Em finais dos anos quarenta do século passado, uma publicação norte-americana divulgou uma gravura ilustrativa com a suposta fisionomia do navegador. Está datada de 1939 e mostra um João Rodrigues Cabrilho muito diferente das duas gravuras anteriores. (Fig. 3)
Em 1935 o Governo português pretendendo honrar Cabrilho encarregou o escultor Álvaro de Brée de esculpir uma estátua para oferecer ao Estado da Califórnia. A estátua após passar por várias peripécias que ficariam conhecidas pelo “Caso da estátua raptada” e narrei oportunamente, (2) foi edificada na cidade de San Diego em 1940. (Segundo informes obtidos no Museu do “Cabrillo National Monument” daquela cidade, o monumento somente seria oficialmente inaugurado em 28/09/1949).
Em consequência da erosão, nos meados dos anos oitenta era já notório o desgaste da estátua. Foi então substituída por uma réplica. Charters de Almeida encarregou-se de esculpir a obra oferta de uma senhora americana. (Fig. 4). À semelhança da anterior, a estátua evidencia um semblante determinado, olhando a baía de San Diego que Cabrilho avistou em 29 de Setembro de 1542 durante a sua viagem de descobrimento da Costa da Califórnia. Porém, o rosto é muito diferente de qualquer das gravuras atrás referenciadas. Diferente, é também o rosto da estátua erigida em 1989 na Praça principal de Montalegre da responsabilidade da Câmara Municipal dessa época. (Fig. 5)
À semelhança da anterior, a estátua evidencia um semblante determinado, olhando a baía de San Diego que Cabrilho avistou em 29 de Setembro de 1542 durante a sua viagem de descobrimento da Costa da Califórnia.
Porém, o rosto é muito diferente de qualquer das gravuras atrás referenciadas. Diferente, é também o rosto da estátua erigida em 1989 na Praça principal de Montalegre da responsabilidade da Câmara Municipal dessa época. (Fig. 5)
Em 1969, os Correios de Portugal quiseram honrar Cabrilho com a emissão de três selos reproduzindo a estátua de San Diego. (Fig. 6).
O Governo português em 1992 mandou cunhar uma moeda comemorando assim os 450 anos do descobrimento da Costa da Califórnia pelo navegador barrosão. (Fig. 7). Conforme se constata a fisionomia é também diferente.
Em 1992, os Correios dos Estados Unidos com o mesmo propósito do Governo português emitiram um selo. (Fig. 8) Contudo, o nome do navegador foi escrito em espanhol. Quando se descobriu a fraude e vozes discordantes se manifestaram, o selo da discórdia conforme ficou conhecido, já circulava pelo Mundo apenso em cartas provenientes dos Estados Unidos da América. De notar a face de Cabrilho apresenta um aspecto completamente diferente das demais.
Reproduzi algumas caras de Cabrilho dentre outras que tenho visualizado. Fico por aqui. Antes, vou revelar um caso assaz invulgar que denota a importância reconhecida a Cabrilho no Estado da Califórnia. Na parede interior de uma igreja de San José, cidade californiana não muito distante de San Francisco, fui encontrar um medalhão em porcelana com a hipotética fisionomia do navegador. (Fig. 9)
A qual das caras representadas corresponde a verdadeira cara de Cabrilho?
Antes de responder abro um parentese para falar de Santo António, o nosso Santo António nascido em Lisboa, falecido em Pádua na Itália. Quem desconhece o aspecto do santo casamenteiro? Frade rechonchudo vestindo o hábito de franciscano geralmente com o menino Jesus ao colo. A pintura considerada mais antiga do Santo é muito diferente da representação tradicional de Santo António. Está preservada numa igreja de Florença. Presumivelmente datada de 1250 é da autoria de um pintor florentino. O quadro mostra um Santo António magro de barba branca. Não é um retrato verosímil. O pintor nunca terá visto o Santo. A representação tradicional de Santo António anafado com o menino Jesus ao colo também não é verdadeira. Trata-se de uma invenção barroca sem credibilidade. Parece lógico admitir: a representação de Santo António não é plausível.
Respondo agora à pergunta que motivou esta crónica: A qual das fisionomias representadas corresponde a verdadeira fisionomia de Cabrilho?
Nenhuma. Infelizmente desconhece-se a fisionomia do descobridor da Costa da Califórnia, porque não chegou até ao presente qualquer documento credível com um retrato seu ou uma descrição física feita por um coevo. Nem o Archivo General de Indias em Sevilha que guarda o maior manancial da documentação dos descobrimentos e conquistas espanholas no Novo Mundo, nem os Arquivos e Museus de História da Guatemala território onde Cabrilho viveu durante vários anos, tão pouco o Museu do “Cabrillo National Monument” de San Diego, indiciam qualquer informação fisionómica do navegador. Os cronistas descrevem-no como “hábil besteiro; navegador e piloto de valor com grande conhecimento em assuntos marítimos; bom explorador de costas; ilustre; valente; honrado; …”. Sobre o seu aspecto físico: nada. Não existindo um retrato de Cabrilho chegado à actualidade a sua fisionomia aparece diferenciada conforme a inspiração do desenhador, pintor ou escultor e se constata nos exemplos apresentados. O seu rosto permanece um enigma. Portanto, quando se observar uma gravura com o presumível retrato de Cabrilho não tem valor histórico. A inexistência de um retrato do navegador não é grave. Quantos navegadores portugueses que desbravaram os oceanos não deixaram qualquer retrato. Grave, é responsáveis pela divulgação da Cultura na Internet, Órgãos de comunicação social e outros, induzirem os leitores em erro divulgando falsos retratos. Grave, é esse notável descobridor e conquistador do Novo Mundo, (América) o mais notável barrosão de sempre, ser mal-amado por ignorância de alguns e por malvadez de outros.
NOTAS:
- Quem pretender adquirir mais conhecimentos sobre o percurso de João Rodrigues Cabrilho desde o nascimento até à morte, poderá obtê-los nos livros: “Os passos de Cabrilho”, “João Rodrigues Cabrilho um Homem do Barroso?”, “Montalegre e o Descobridor da Costa da Califórnia” e “Histórias de Vidas”, da autoria do signatário desta crónica, preservados em diversas bibliotecas do país nomeadamente na Biblioteca Nacional de Lisboa, na Biblioteca Municipal do Porto, Biblioteca Municipal de Coimbra, e, obviamente, na Biblioteca Municipal de Montalegre.
- Tavares, João Soares – “João Rodrigues Cabrilho um Homem do Barroso ?”, 1998
(João Soares Tavares escreve segundo o anterior acordo ortográfico.)
(A reprodução do texto, fotografias e gravuras que compõem este trabalho só é autorizada mencionando a origem.)
Recentemente terão mexido no sopé ou e arredores do Monumento Nacional a Cabrilho em S. Diego,colocando uma placa onde se pretende reconhecer que João Rodrigues Cabrilho é de sangue espanhol. Esta versão é abusiva e ofende a Academia Portuguesa de História que nos anos oitenta do século XX, mandou investigar as origens desse Navegador. Dessa investigação resultou uma decisão científica na qual se afirma que João Rodrigues Cabrilho nasceu no lugar da Lapela, freguesia de Cabril, concelho de Montalegre.
Na sequência desse estudo e dessa conclusão o Historiador Beirão Dr. João Soares Tavares aprofundou aquela conclusão e, ao longo dos anos, continuo a visitar todos as fontes possíveis factos que passou a filmes (tanto mais que é cineasta) e historiador profissional e sempre consolidou as probabilidades recolhidas pela Academia Portuguesa. Inclusivamente preparou e editou diversos livros da sua autoria e a convite da Câmara de Montalegre onde tal conclusão prossegue como autêntica e irrefutável. Na qualidade de Jornalista (do JN), da época em que a MISS Cabrilho tinha,como prémio, direito a visitar a terra natal desse navegador que ao serviço do governo de Espanha, aportou em S. Diego, em 1542, falecendo em 1543, fui o primeiro a alertar a Câmara de Montalegre que, logo tomou a seu cargo, a decisão de proceder a um estudo exaustivo. O membro da Academia de História Dr. Montalvão Machado, deslocou-se propositadamente a Montalegre, em representação daquela Academia e fui eu próprio que apresentei esse Orador. Presidia à Câmara nessa altura o prof. Carvalho de Moura que algum tempo depois convidou o então I Ministro, para vir inaugurar o monumento alusivo ao ilustre Barrosão. Nos últimos anos do mandato final do Dr. Fernando Rodrigues, foi ele próprio que deliberou publicar um novo livro do Dr. João Soares Tavares, em cujo prefácio, o autarca que mais tempo esteve na Câmara, reconhece que Carvalho de Moura fizera bem e que por isso, clarificava um diferendo que politicamente foi mal interpretado.
Soube, agora,desta placa colocada«na última sexta, dia 4, de Outubro de 2018 que retiraria autenticidade na pesquisa Portuguesa, a favor de Espanha. Todos nós sabemos que João Rodrigues nasceu na Lapela, freguesia de Cabril. Que por gosto ou por necessidade de ganhar a vida, emigrou para Espanha, cuja fronteira dista a meia dúzia de km. Terá ido até Sevilha onde se preparou para essa árdua tarefa, mas ao serviço do Rei de Espanha, o que é legítimo. Ao nome próprio de João Rodrigues terão adicionado o topónimo de «Cabrilhe / Cabrilho». Quando esta placa chegar ao conhecimento do Dr. João Soares Tavares, estou certo que colocará a sua competência técnica e científica ao serviço da verdade.